Por Elói
Kreutz *
- Minha última
esperança é o Jornal das 7! disse, entre
ironia e tristeza, uma colega professora durante o recreio das quinze e trinta.
Já havia
pulado da cama às seis da manhã, movida por uma tênue esperança de que hoje
haveria uma grande notícia. Ainda de pijama, antes mesmo de escovar os dentes,
ligou confiantemente a tevê e deixou a
porta do banheiro aberta para, afinal, ouvir a tão esperada novidade.
“Bom-dia,
telespectadores, hoje é dia 15 de outubro. Antes de mais nada, lembramos que
nesta data comemoramos com carinho o dia dedicado aos nossos mestres. Parabéns
a todos os professores. Vamos hoje mostrar a história de um professor que,
apesar de todas as dificuldades, baixo salário, falta de reconhecimento, e
blablablablablá...”
Desapontada
por não ter ouvido o que tanto queria, olha para o relógio. Já são quase horas
de sair para mais um dia letivo. Absorta que estava no noticiário, nem viu o
tempo passar. Não havia nem tomado café. Rapidamente, enquanto se arrumava e
pensando nas aulas que teria que dar, engoliu alguns biscoitos, agarrou os
livros e voou para a escola.
- Bom-dia,
colegas. Parabéns pelo nosso dia. Pena que nada..., né? Vocês viram? Será que
vamos de novo ter as expectativas frustradas? Será que nada vai ser anunciado
hoje?
- Calma,
colega. Talvez é puro suspense. Ainda tem o Jornal do Almoço!
- É, pode
ser que o anúncio vai ser feito quando tiver mais gente com a tevê ligada, pois
vocês sabem que isto dá mais votos.
Cabisbaixa e
tristonha foi para a sala de aula. Mais sensível do que de costume, esperou que
os alunos ao menos lhe dessem um abraço. Mas nada. Ninguém se manifestou.
Todos, sonolentos, com cara de feriado ainda, nem fizeram menção de lhe dar os
parabéns. E assim foram as três primeiras aulas.
Na hora do
recreio, já na sala dos professores, alguém perguntou:
- Escuta, os
alunos se lembraram de que hoje é o nosso dia? Nem ao menos os parabéns recebi.
Alguém recebeu?
Todos se
entreolharam. Uma colega ainda tentou amenizar:
- Ah, isto é
por timidez, eles se sentem constrangidos.
A manhã parecia
mais longa. Não queria passar. Finalmente soou a sineta do final do último
período. Quase atropelando os alunos, guardou rapidamente o material didático e
correu para casa. Esqueceu até de cumprimentar o marido e as crianças. Avançou
para o controle e ligou a televisão. Nunca o almoço havia sido tão silencioso.
Nenhum barulhinho de talheres. Nada de conversa. Parecia que as notícias
entrariam pela boca.
- Mas não é
possível. Será que esse governador quer nos matar à míngua? Pois era hoje o dia
que ele faria o grande anúncio. Eu esperei por isso tanto tempo. Não aguento
mais. Perdi até o meu apetite.
A vida
continua. A rotina tem que ser cumprida. Já é hora de tomar o caminho de mais
uma jornada. Os alunos do período vespertino já faziam algazarra na frente do
portão da escola, quando estacionou seu carro usado de doze anos.
Entretanto,
algo lhe martelava na cabeça, não conseguia se concentrar nas aulas que
ministrava. Aquele dia deveria ser diferente dos outros. Haveria, afinal, o
anúncio que tanto aguardava? Ainda restava o Jornal das 7...
*Professor de Português da Rede Estadual de Ensino do RS
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ResponderExcluirPerfeito! Muito orgulho do meu pai e de todos os professores que fazem da esperança a força para seguir em frente!
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